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TRANSTORNOS DEPRESSIVOS

1. DEFINIÇÕES

1.1 Transtorno depressivo
A organização Mundial da Saúde (OMS) define depressão como um
transtorno mental caracterizado por tristeza, perda de interesse, ausência de
prazer, oscilações entre sentimentos de culpa e baixo autoestima, além de
distúrbios do sono ou do apetite. É também comum relatos de cansaço e falta de
concentração. A doença pode ser de longa duração ou recorrente, e na sua
forma mais grave pode culminar num suicídio.
A OMS chegou a afirmar, fundamentada em estudos e pesquisas, que
nos próximos anos a depressão será a segunda maior causa de morte mundial
por doença, ficando atras apenas das doenças cardíacas.

1.2 Neurofisiologia da depressão
Avanços nas pesquisas em psiquiatria biológica, permitiram a descoberta
de numerosas alterações neuroquímicas, neuroendócrinas e neuroanatômicas
na depressão unipolar. Essas alterações favorecem que um indivíduo com
depressão desenvolva doenças cardiovasculares.
Entre as alterações no eixo hipotalâmicopituitário-adrenocortical, hiper-
reatividade simpático-adrenal, alterações nos receptores plaquetários e aumento
na secreção de citocinas pró-inflamatórias além da instabilidade e isquemia
miocárdica relacionada ao estresse mental.
Indivíduos com transtorno depressivo possui uma desregulação no
sistema simpático adrenérgico.

A hiper-reatividade simpática-adrenérgica contribui para o
desenvolvimento de doenças cardiovasculares através dos efeitos das
catecolaminas no coração, vasos sanguíneos e plaquetas. A ativação simpática
modifica as funções das plaquetas induzindo mudanças hemodinâmicas.
A inflamação e a secreção de citocinas pró-inflamatórias podem mediar a
associação entre depressão e a progressão aterosclerótica. A atividade do
sistema límbico é regulada por muitos neurotransmissores envolvidos na
fisiopatologia e possivelmente na etiologia dos transtornos mentais.
Sabe-se que os níveis séricos do hormônio cortisol estão aumentados no
indivíduo deprimido.
Estudos recentes sugerem que a depressão é um importante fator de
risco não somente para o desenvolvimento da doença coronariana (DAC), mas
também para a mortalidade entre os pacientes que sofreram infarto do
miocárdio.
Devido ao comum subdiagnóstico da depressão, os sintomas acabam
sendo atribuídos a doenças físicas, contribuindo para o agravamento e
recorrência da doença.

1.3 Conceituação histórica da depressão

A depressão é uma doença bastante comum caracterizada por uma
tristeza profunda e duradoura, acompanhada por sentimentos de menos valia,
perda do interesse em atividades, sensação de vazio, falta de energia, apatia,
desânimo, perda da esperança, pensamentos negativos e pessimistas.
Os transtornos depressivos têm recebido, por parte dos psicanalistas,
desde os pioneiros até os autores mais atuais, uma profunda e crescente.

atenção e investigação em várias linhas de abordagem, devido a sua grande
complexidade.
Freud, descreveu a depressão e a melancolia, no texto intitulado “Luto e
Melancolia” (1917). Na época, Freud escreveu, que depressão era sinônimo de
melancolia, não fazendo uma distinção clara, sendo “melancolia” a palavra mais
usada. Freud continua sua descrição da depressão com a famosa frase, diz
que, “na melancolia, a sombra do objeto cai sobre o ego”, com isso
caracterizando o quadro depressivo resultante de uma identificação do ego com
o objeto perdido. Segundo ele, quando o luto não é suficientemente elaborado,
resulta que o objeto e o ego, num processo que lembra o fenômeno da osmose,
confundem-se entre si de tal sorte que o destino de um, passa a ser o destino do
outro.
Lacan, deu continuidade ao trabalho de Freud, já em um momento
histórico diferente, onde a depressão não era assunto tão difundido na
sociedade. A tristeza, por exemplo, ele qualifica como depressão, ao se lhe dar
por suporte a alma, bem como a tensão psicológica do filósofo Pierre Janet. Mas
esse não seria um estado de espírito, mas simplesmente uma falha moral, um
pecado, o que significaria uma covardia moral, que só é situado, em última
instância, a partir do pensamento, isto é, do dever de bem dizer, ou de se
referenciar no inconsciente, na estrutura. (Lacan, 1974/2003).
Zimerman (2007), afirma que os quadros clínicos de depressão, nas suas
múltiplas formas e graus, adquirem uma crescente importância na prática
analítica, assumindo a condição de predominância na motivação para a busca
de tratamento. Segundo ele, tal afirmativa pode ser comprovada por meio dos
seguintes dados estatísticos: entre as dez mais importantes causas
incapacitantes dos indivíduos, cinco são psiquiátricas, e, nessas, a depressão –
especialmente a “depressão maior unipolar” – é a primeira delas. Ele afirma
ainda que em geral, os médicos não-psiquiatras, em uma média de 50%, não
diagnosticam, e entre os que fazem o diagnóstico, quase sempre tratam mal, equivocadamente usando benzodiazepínicos ou, acertadamente,
antidepressivos, porém em dosagens inadequadas.
Ainda segundo Zimerman, o número de depressões está aumentando,
não só em números absolutos, mas também em números relativos a outras
épocas. Importante salientar que na maioria das patologias mentais existe,
subjacente, alguma forma de base depressiva. O grande aumento do número
de pacientes deprimidos que procuram análise deve-se, segundo ele, em grande
parte, ao fato de que vem mudando o perfil da pessoa que busca alguma forma
de tratamento, psicoterápico ou medicamentoso, pois, as atuais condições
competitivas de cada pessoa para conseguir algum desfecho profissional
favorecem o surgimento da sensação de fracasso pessoal, o que afeta
severamente a autoestima e, daí a eclosão de quadros depressivos. Ele afirma
ainda, ser grande o número de “depressões subclínicas”, isto é, estados
depressivos que não se manifestam de forma habitual e clara, mas, sim, por
meio de sinais e sintomas discretos e sutis, como um estado de continuada
apatia; assim como a depressão pode se revelar por meio de manifestações
equivalentes, como a de uma hipocondria, alcoolismo, transtornos alimentares,
do sono e outros.
Para Winnicott, do ponto de vista psicológico, avalia-se a depressão como
uma experiência dolorosa, paralisante, incapacitante e solitária. Sob o aspecto
biológico, verifica-se um desequilíbrio das reações químicas responsáveis pelo
estado de ânimo e humor deprimido.
Winnicott observa a depressão por outro ângulo, afirmando que os
fenômenos depressivos possuem sua origem no estágio de amadurecimento,
sendo entendido como um fenômeno comum, consequência do luto e do
sentimento de culpa (Winnicott, 1984).
Ele afirma ainda que, a interação frágil do ego (ego fraco), por não ter sido
consolidado adequadamente, faz com que a pessoa se torne incapaz de tolerar
alguns sentimentos e pensamentos, ou administrar conflitos internos resultantes
das experiências relacionais, sucumbindo aos estados depressivos.

2. CLASSIFICAÇÃO DOS TRANSTORNOS DEPRESSIVOS
O Vocabulário Contemporâneo de Psicanálise (2001), classifica os
transtornos depressivos como resultantes de:
1. Perdas (perdas de objetos necessitados e, ambivalentemente, amados e
odiados; ou perdas de capacidades do ego).
2. Culpas (devidas a um superego demasiadamente rígido e punitivo; obtenção
de êxitos que mobilizam uma necessidade de castigo; culpas imputadas pelos
outros).
3. Fracasso narcisista.
4. Ruptura de determinados papéis impostos à criança e que o adulto repete estereotipadamente.
Zimerman (2007) classifica o estado depressivo em três tipos:
1. Atípica: era mais conhecida com os nomes de “depressão neurótica” ou
“depressão reativa”. Seu perfil é único e resulta de alguma forma de crise
existencial, por razões predominantemente internas ou externas. Geralmente
não respondem bem à medicação.
2. Endógena: resultado de causas orgânicas que manifesta-se com
sintomatologia mais típica, adquirindo características “unipolares” (os sintomas
são unicamente depressivos) ou “bipolares” (os sintomas tanto podem ser da
esfera depressiva ou, em um pólo oposto, de natureza “maníaca”). Apesar de
serem endógenas, comumente elas podem ser desencadeadas por fatores
ambientais, assemelhando-se qualitativamente à depressão atípica. Costuma
responder bem a medicação antidepressiva, quando adequadamente ministrada e, principalmente, quando acompanhada de alguma forma de terapia de base
analítica.
3. Distímica: corresponde à depressão que comumente era chamadas de
“crônica”, de duração mais prolongada que responde bem a associação de
medicamentos e terapia analítica.

2.1 DEPRESSÃO ATÍPICA
O conceito de depressão atípica refere-se àquelas formas de depressão
caracterizadas por reatividade do humor, sensação de fadiga acentuada e “peso”
nos membros, e sintomas vegetativos “reversos” (opostos aos da depressão
melancólica), como aumento de peso e do apetite, em particular por carboidratos
e hipersonia. Além disso, descreve-se como característica constante das
pessoas sujeitas a esse tipo de depressão um padrão persistente de extrema
sensibilidade à percepção do que consideram como rejeição por parte de outras
pessoas. Episódios com características “atípicas” são mais comuns nos
transtornos bipolares (I e II), no transtorno depressivo com padrão sazonal.
Especialmente no hemisfério norte, onde as estações do ano são bem definidas,
verifica-se com clareza que algumas formas de depressão acentuam-se ou são
precipitadas de acordo com um padrão sazonal; mais comumente as depressões
desse tipo ocorrem no outono e no inverno. Muitos desses pacientes têm fases
hipomaníacas na primavera, sendo classificados como do tipo bipolar II
(depressões maiores e hipomania). Frequentemente esses pacientes
apresentam algumas características sobrepostas às da depressão atípica, como
fadiga excessiva, aumento do apetite (em particular por carboidratos) e hiper
sonolência.

2.2 DEPRESSÃO ENDÓGENA
A depressão endógena é descrita como uma ocorrência espontânea, que
não guarda relação com precipitantes psicossociais, estando na dependência de
uma base que residiria no organismo. Um acontecimento organísmico, cuja
natureza ainda se ignora, provoca a depressão endógena; uma ocorrência
desfavorável no mundo próprio do paciente provoca, em certos predispostos,
uma depressão reativa; uma ocorrência orgânica — cerebral ou não, reversível
ou não — pode provocar em determinados indivíduos uma depressão. O
potencial para o desenvolvimento dessa patologia diverge de pessoa para
pessoa. Na depressão endógena, a tristeza, quase sempre originária, é descrita
como tristeza nítida, pura, saliente, clara; em outras palavras, o acontecimento
depressivo é, nas depressões endógenas, mais extrínseco à personalidade
anterior, sendo, qualitativamente, diverso das demais depressões.

2.3 DEPRESSÃO DISTÍMICA
A depressão distímica ou distimia é uma forma de depressão crônica,
não-episódica, de sintomatologia menos intensa do que as chamadas
depressões maiores. O padrão básico desses pacientes é um baixo grau de
sintomas, os quais aparecem insidiosamente, na maioria dos casos antes dos 25
anos. Apesar dos sintomas mais brandos, a cronicidade e a ausência do
reconhecimento da doença fazem com que o prejuízo à qualidade de vida dos
pacientes seja considerado maior do que nos demais tipos de depressão. Os
pacientes com transtorno distímico frequentemente são sarcásticos, niilistas,
rabugentos, exigentes e queixosos. Eles podem ser tensos, rígidos e resistentes
às intervenções terapêuticas, embora possam comparecer regularmente às
consultas. Como resultado disso, o médico pode vir a desconsiderar suas
queixas. Apesar de o transtorno favorecer um funcionamento social
relativamente estável, essa estabilidade é relativa, visto que muitos desses
pacientes investem a energia que têm no trabalho, nada sobrando para o prazer e para as atividades familiares e sociais, o que acarreta atrito conjugal e familiar.
A distimia pode ser um subtipo adaptativo de humor que se desenvolveu para
enfrentar estados de estresse ou carências. Assim, certas características de
humor deprimido poderiam conferir vantagens evolucionárias em condições
específicas, sendo benéficas em certas subpopulações e ambientes,
selecionando-os com o passar do tempo. Como uma condição mal adaptativa, a
distimia se manifesta clinicamente como um afastamento da rotina de atividades
diárias ao invés de enfrentá-las. Diferenças de gênero – dominância feminina –
em distimia e depressão também podem ter uma razão evolucionária
(Spanemberg, L.; Juruena M.F. 2004).

2.4 DEPRESSÃO PSICÓTICA
A depressão psicótica foi descrita por Winnicott e descreve os estados
depressivos relacionados a perdas que ocorrem antes ou durante a fase de
amadurecimento da criança que ainda não é capaz de reagir a perda sem
comprometimento da organização da personalidade promovendo a
desestabilização do indivíduo.
Nas depressões psicóticas, manifesta-se de forma nítida a mistura e
alternância dos estados depressivos. Podem surgir sintomas clínicos
semelhantes a esquizofrenia, devendo haver cautela no diagnóstico.

3. SINTOMAS DEPRESSIVOS

3.1 SINTOMAS PSÍQUICOS
Os sintomas psíquicos mais comuns são o humor depressivo, sensação
de tristeza, autodesvalorização e sentimento de culpa. Os pacientes costumam
aludir ao sentimento de que tudo lhes parece fútil, ou sem real importância.
Acreditam que perderam, de forma irreversível, a capacidade de sentir alegria ou prazer na vida. Tudo lhes parece vazio e sem graça, o mundo é visto sem
alegria. Certos pacientes mostram-se mais apáticos do que tristes, referindo-se
muitas vezes ao “sentimento da falta de sentimentos”. Referem já não se
emocionarem com nada, ou sentir-se indiferente ao sofrimento de um ente
querido. O deprimido, com frequência, julga-se um peso para os familiares e
amigos, muitas vezes desejando a morte. São frequentes as ideias de suicídio.
Pessoas deprimidas podem relatar que já não se interessam pelos seus
passatempos prediletos. As atividades sociais são frequentemente
negligenciadas, e tudo lhes parece sem sentido. A pessoa pode relatar fadiga
persistente, mesmo sem esforço físico, e as tarefas mais leves parecem exigir
esforço substancial. Lentifica-se o tempo para a execução das tarefas.
Diminuição da capacidade de pensar, de se concentrar ou de tomar decisões.
Decisões antes quase automáticas parecem agora custar esforços
intransponíveis. Um paciente pode se demorar infindavelmente para terminar um
simples relatório, pela incapacidade em escolher as palavras adequadas. O
pensamento pode estar notavelmente lentificado.
Em crianças e adolescentes, sobretudo, o humor pode ser irritável, ou
“rabugento”, ao invés de triste. Podem apresentar queda em seus rendimentos
escolares, geralmente em função da fatigabilidade e déficit de atenção, além do
desinteresse generalizado.

3.2 SINTOMAS FISIOLÓGICOS
Os sintomas fisiológicos são muito frequentes e comumente se
apresentam como alterações do sono (mais frequentemente insônia, podendo
ocorrer também hiper sonolência).
A insônia é, mais tipicamente, intermediária (acordar no meio da noite,
com dificuldades para voltar a conciliar o sono), ou terminal (acordar mais
precocemente pela manhã). Pode também ocorrer insônia inicial. Com menor frequência, mas não raramente, os indivíduos podem se queixar de sonolência
excessiva, mesmo durante as horas do dia.
Podem ocorrer alterações do apetite (mais comumente perda do apetite,
podendo ocorrer também aumento do apetite). Muitas vezes a pessoa precisa
esforçar-se para comer, ou ser ajudada por terceiros a se alimentar. As crianças
podem, pela inapetência, não ter o esperado ganho de peso no tempo
correspondente. Algumas formas específicas de depressão são acompanhadas
de aumento do apetite, que se mostra caracteristicamente aguçado por
carboidratos e doces.
Esse consumo aumentado de carboidratos e doces alimenta um ciclo
perigoso, uma vez que eles  podem levar ao aumento de substâncias pró-
inflamatórias responsáveis pela liberação de neurotransmissores como o cortisol
e a noradrenalina. Em desequilíbrio, os dois tendem a aumentar o estado de
ânimo.
Encontra-se também relatos de redução do interesse sexual, retraimento
social, crises de choro, comportamentos suicidas, retardo psicomotor e
lentificação generalizada, ou agitação psicomotora. Frequentemente os
pacientes se referem à sensação de peso nos membros, ou ao “manto de
chumbo” que parecem estar carregando. Em recente revisão da literatura sobre
os estados depressivos, o item “retardo psicomotor” foi o denominador comum,
em nove sistemas classificatórios, como traço definidor da melancolia.
Na Austrália, Gordon Parker e colaboradores propuseram, para o
diagnóstico da melancolia, um sistema baseado não em “sintomas” (subjetivos),
mas em “sinais” (características objetivas, observáveis): o sistema “core”, que
tem sido cada vez mais utilizado pelos pesquisadores nessa área. Na França,
Daniel Widlöcher e colaboradores, na Salpêtrière, desenvolveram uma escala
especificamente destinada a medir o retardo psicomotor.
Deve-se observar, no diagnóstico das depressões, que algumas vezes o
quadro mais típico pode ser mascarado por queixas proeminentes de dor crônica
(cefaleia, dores vagas no tórax, abdome, ombros, região lombar, etc.). A

MANEJO CLÍNICO
Em relação às depressões endógenas, o uso de recursos
psicofarmacológicos apresenta boa resposta terapêutica, tendo em vista que
pertencem mais particularmente à área da psiquiatria, não havendo prejuízo
algum – pelo contrário – entre a concomitância do emprego da medicação e o
prosseguimento normal da análise, pelo contrário, farmacologia e terapia se
complementam no tratamento do indivíduo acometido da patologia. Um aspecto
prático que cabe ressaltar é o de que o analisando e o analista aprendam a
reconhecer e a discriminar as diferenças clínicas constantes de sinais e
sintomas típicos e específicos entre essas depressões e os estados depressivos
de outra natureza.
Quanto às depressões por perda, o analista deve considerar que esse tipo
de paciente deprimido sofreu uma profunda perda, seja ela física ou afetiva e,
por isso, se mantém em um estado permanente de carência, amargurando os
sentimentos de desesperança. São pacientes muito propensos a somatizar.
Podem se tornar pessoas vingativas e rancorosas, e, na situação analítica, esse
ressentimento crônico pode traduzir-se sob a forma de desistência. Nesses
casos, é importante a atitude psicanalítica interna do terapeuta, de forma a ele
vir a ser introjetado pelo paciente como um objeto confiável, pois consegue
conter suas angústias, demonstra prazer com sua presença, impõe-lhe limites
quando necessário, não o trai ou o engana e tampouco desaparece.
Nas depressões resultantes de significativas perdas, costuma haver por
parte do paciente uma significativa, prematura e intensa idealização da pessoa
do analista, como forma inconsciente de recuperar o lado bom e necessitado do
objeto perdido. A recomendação técnica é que o terapeuta aceite essa
idealização tão necessária para o equilíbrio de seu paciente deprimido, desde
que fique bem claro para o analista que essa idealização deve ser transitória e
vir a ser, gradativamente, desfeita.

Nos casos em que a depressão é resultante de culpas, a principal
recomendação técnica consiste na cautela que o analista deve ter diante da
costumeira possibilidade de que a compulsão inconsciente do paciente o induza
a estabelecer um vínculo analítico de natureza sadomasoquista. Se o analista
ficar contratransferencialmente envolvido, o mais provável é que suas
intervenções virão confundidas com advertências, cobranças, normas e
acusações, o que virá de encontro ao núcleo masoquista do paciente e, nessa
situação, o processo analítico desembocará em um repetitivo círculo vicioso
fechado, sem possibilidades para novas saídas. Cabe ao terapeuta, abrandar a
tirania do superego “mau” do paciente e, tanto quanto possível, transformá-lo em
um superego “bom”. Igualmente é tarefa do analista prover ao paciente a
capacidade de ele fazer discriminações entre as culpas que, de fato, são devidas
e que podem vir a ser reparadas, daquelas outras culpas que lhe foram
indevidamente imputadas – o que exige um trabalho de fazer ressignificações
que ficaram impressas no ego de forma patogênica, para que ele possa se livrar
delas.
Nos casos em que o colapso narcisista é o responsável pela depressão,
como uma consequência da decepção sofrida pelo seu ego ideal e pelo seu
ideal do ego, a ênfase da técnica analítica consiste em que se promova uma
gradual e muito difícil renúncia às suas grandiosas e ilusórias aspirações. Não é
tarefa fácil para tais pacientes reconhecer que não são o que pensavam que
eram ou gostariam de vir a ser, e que não o são e que, muito provavelmente,
nunca virão a sê-lo. De fato, é uma transição de mudança psíquica muito penosa
para o analisando, pelo fato de que o sentimento depressivo de perda de sonhos
tão caros e antigos vem mesclado com sentimento de fracasso, luto e
humilhação. Por outro lado, se o sentimento de fracasso narcisista do paciente
deve-se à sua convicção de ter decepcionado as expectativas das pessoas que
representam o seu “ideal de ego”, a técnica analítica consiste em trabalhar
sistematicamente na transferência das identificações projetivas que o paciente
reproduz com o analista, tendo em vista que este também é um importante
representante do seu ideal do ego. Nestes casos, o tipo de contratransferência despertada no analista, em cujo caso pode servir para o terapeuta como uma
“bússola empática”, ou se ela é patológica, e, nessa situação, o analista,
sobretudo quando também ele tem expectativas narcisistas em relação ao seu
paciente, acaba reforçando ainda mais no paciente a sensação de ser um
fracassado.
Podem ocorrer também as pseudodepressões, neste caso, o aspecto
mais importante a ser destacado é a necessidade de o psicanalista ter bem claro
para si a distinção entre as aparências falsas de depressão e os verdadeiros
estados depressivos. Uma vez estabelecida a diferença, o manejo técnico
consiste em fazer o respectivo desmascaramento da falsidade das queixas
depressivas, acompanhado da atividade interpretativa enfocada nas fantasias
inconscientes responsáveis por essa estruturação enganosa.
Nos casos em que está justificado o uso de medicação antidepressiva, é
necessário que o analista tenha em mente que o mais indicado é que haja uma
complementação entre o uso medicamentoso e a concomitância da terapia
analítica. Isoladamente, um deles, sem o auxílio do outro, perde em muito a
eficácia.
Os terapeutas da atualidade estão, cada vez mais, levando em
consideração os sinais e sintomas apresentados pelo paciente, mesmo que não
muito específicos, bem como a existência de depressões em crianças e
adolescentes, com características específicas da faixa etária, e que merecem
uma atenção acurada, contando, se necessário, com a colaboração de
psicofármacos. Observa-se que, entre os adolescentes depressivos, existem
claras evidências de que há um grande risco de que a depressão não seja
superada e que possam resultar diversos problemas em etapas posteriores da
vida, incluindo a depressão maior (TDM) e a possibilidade de suicídio.
(Zimerman, 2008)

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ZIMERMAN, David E. Fundamentos Psicanalíticos. Porto Alegre: Artmed 1999.
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Este material sobre: Transtornos depressivos , foi escrito por Isis Claudia Cabral, aluna formada no nosso Curso Livre de doutorado em psicanálise.

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